Verônica
amava o silêncio. Mas, o silêncio incomodava. As pessoas são apegadas às
palavras e não a gestos, pois os gestos as fazem ter de interpretar, elas não
querem isso, querem algo mais fácil e falar é mais fácil, mesmo que às vezes,
a ignorância não deixe ser entendida a mensagem que quer se
passar. A linda moça, não falava por não gostar de falar, não expressava
qualquer sentimento e seu olhar era sempre vago. Ela achava que o mundo era
grande demais, pois isso resolveu recolher as palavras a fim de indagar, já que
ninguém tinha boa vontade de ceder um tempo a uma filosofia que ela pudesse
entender os humanos.
Ela não
tinha qualquer sintoma de doença física, era saudável, porém havia algo: era
intensa demais; ou era infernal ou angelical, tudo isso sem falar nada. Mas
também, um olhar seu já bastava, ou era de amor ou de ódio. Não por ela saber
odiar, era uma imitação de ódio que ela entendia por si só, um espécie de
repulsão pela ignorância alheia, a falta de vontade de conhecer e se
importar com seu próximo. E o que ela conseguia dar em troca, era um olhar ou
nenhum.
Sua
família a levara a todos os psiquiatras do país, mas Verônica não respondia,
não piscava, não se movimentava, apenas abria seus grandes olhos azuis
fixamente manipuladores para quem quer que fosse, que estivesse atrás de um
jaleco branco, escrito "doutor". Sempre sem expressão. Não mexia nem
as sobrancelhas.
Eles
diziam que ela não estava na fase certa de aprendizagem, que ela não tinha
autonomia o suficiente para lidar com sua personalidade e, que era isso que
seus pais queriam tanto. Ninguém sabia do que Verônica gostava, por justamente
ela nunca desejar falar ou manifestar gostar de alguma coisa.
Seu
processo de construção da etapa normal da vida humana, como: cognitivo,
psicossocial e biossocial estava estagnado. Ela não reagia. Não na frente de pessoas
errantes e imperfeitas, feito ela, em processo de evolução cuja moral crescia
paulatinamente e, que eram preenchidas de vazios sem sentido, mas cheios de
onipotência/prepotência, os fazendo crer que eram mais que os outros. Não eles
que fariam ela falar alguma coisa. Não eles.
Ela
vivia um nada, mas não para ela. Ela por opção se trancar por um tempo dentro
dela mesma, para que esse momento passasse sem que ela machucasse alguém que
tentasse entender de forma errada o que ela estava querendo. Só uns momentos de
silêncio. Só.
Seu
mundo interior era somente seu e demais ninguém. também era um tipo de refúgio.
Uma
vez ela pensou que seu problema já havia se desenvolvido desde o tempo
ultrauterino. Que quando feto não interagia, nem mexia, ou talvez tenha sido a
falta de sensibilidade da mãe dela durante a gravidez. E talvez, nem o
neurotransmissor dopamina tenha ajudado a transmitir algum sintoma de amor,
nesse caso o cortisol tenha sido o culpado por toda essa destruição neurológica
de Verônica, mas o cerebelo funcionara bem, ela tentava manter o equilíbrio
frente a qualquer ser humano.
Todavia,
Verônica não era de plástico, não sofria adaptações. E nem mesmo, através das
lágrimas ela deixava extrair os sentimentos reprimidos. Havia um aglomerado ali
dentro daquele mundo calado que se mesclava cada vez mais, intercalando
emoções, sentimentos e sensações.
Verônica
só se tornou mais intensa depois que sua mãe a obrigou a escolher um curso de
graduação. Ela nunca gostou da escola. Sofreu com a falta de compreensão dos
seus colegas e até mesmo dos seus professores. Havia a marcação cerrada por ela
não querer falar e o psicólogo havia desistido de ajudá-la, porque toda vez que
ela sentava a sua frente quem chorava era ele, por sentir que aquilo que ela
não queria falar estava a matando por dentro. Ele tirou licença e foi viajar.
Ela nunca falara a respeito com seus pais e mais ninguém. A escola era sinônimo
de inferno.
Os
fatores do seu meio sociocultural eram pobres de conteúdo, ela ainda não havia
construído algo que significasse tanto para ela.
Um
dia, Verônica foi para a janela. Saiu do seu mundo abstrato e foi ver o mundo
lá fora. estava começando a enjoar daquela fase quientante. Uma música
soava e talvez viesse da casa da vizinhança. Era um som tranquilo e isso a fez
arregalar os olhos. Ela viu pássaros azuis bem pequenos voarem em grupos e
cantar; o sol ardia as plantas verdes e as deslumbrava ao olhar humano; o
cheiro de natureza adentrou seu campo olfativo, suave, aceitável. Nesse
momento, Verônica fechou os olhos e quis sentir o mundo que tanto bloqueou. A
vida passava por ela e ela não queria mais ver.
Sua
percepção ganhou vitalidade. Começou a querer assimilar a realidade, aos poucos
saindo da casca grossa que ela mesma havia criado. Verônica sorriu, pela
primeira vez em anos. Foi a cena mais bonita que a natureza poderia presenciar
naquela tarde outonal.
-
Tudo isso é tão lindo. – Proferiu as palavras com cuidado.
Alguém
a ouviu e se aproximou, e também abraçou Verônica. Ela sabia que uma hora isso
ia acontecer, era somente necessário que dessem espaço a ela. Esse mundo humano
a sufoca de vez em quando. Ficar calada e não se expressar era uma forma de não
interagir para não se machucar.
Então,
Verônica se deixou sentir. Abriu as portas fechadas e seus egos voltaram a se
recolher. Mesmo que o equilíbrio frente aos outros continuasse, o equilíbrio
interior estava voltando a funcionar, tudo porque Verônica sentiu necessidade
de mostrar um pouco de normalidade para que as pessoas parece de a olhar
diferente e a ver com preconceito. Havia outros métodos de as pessoas a
conhecerem, desde que ela deixasse.
E
foi então que a dual Verônica se tornou uno, ao olhar alheio, mas que em seu
mundo continuou as suas manifestações de silêncios não contaminantes a outrem.
Visto que ser diferente é assustador para ouvidos e olhos que não sabem sair do
robotismo, que é apenas um conforto e um alicerce contra o desconhecido, ou
seja, contra ele mesmo.
Verônica
não tinha medo de ser diferente, apenas sabia que os outros não estavam preparados para aceitar tudo isso.
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